PROFE, POR QUE A SENHORA VEIO ? (CRÔNICA)

PROFE, POR QUE A SENHORA VEIO ? ( CRÔNICA) 
 Telma Oliveira 



 Semana passada fui buscar os netos na escola. Sentada no banco da escola, escutei uma adolescente do nono ano deixar o seu celular para recepcionar sua professora com a seguinte pergunta : _Profe,  por que a senhora veio ? Aquela pergunta inoportuna me remeteu à minha infância. Minha mãe me dizia que a profe era como a segunda mãe. Minha mãe era costureira e sua principal cliente era a diretora da única escola da cidade. Foi assim que com seis anos, enquanto minha mãe tomava as medidas da diretora, tasquei-lhe o pedido : _ Senhora diretora, a senhora me consegue uma vaga na sua escola ? A senhora sorriu e me disse : _ Oh, meu amor, eu acabo de me aposentar, mas eu prometo conversar com a nova diretora, para ver o que fazemos. Naquela época nem todos conseguiam uma vaga na escola e somente aos sete anos ingressava-se no primário. Minha mãe , muito esperta , me colocara na banca da srta, Abigail, uma jovem que ganhava uns trocados para alfabetizar. Com cinco anos eu já lia “hollywood” e todos se admiravam de como eu corrigia os plurais dos mais velhos. Foi assim que, com seis anos, fui levada à sala da professora Ariadne. Muito atenta, eu fazia as tarefas antes mesmo de almoçar, tal o meu nível de alegria e ansiedade. Meu pai era escriturário e ganhava muito pouco, mas todos os meses fazia-se uma grande compra de mês e era sagrado o chocolate da professora. Lembro de haver ganho da prof. Ariadne um conjunto de mesas e cadeiras de brinquedo, em uma festa de São João. Eu e a profe Ariadne estudamos por dois anos. Na terceira série, a professora seria outra. Não sei como consegui chegar em casa quando recebi essa notícia. Chorei por muitos dias aquela falta e no início do ano lá estava a profe Maria do Rosário. Com sua saia de balão e bolinhas, estilo anos sessenta, a profe. Maria do Rosário era carinhosa e cuidadosa. Ainda hoje escuto a sua voz fininha. Minha mãe trocou o chocolate pelas maçãs. As maçãs eram caras e viam do sul, não se achavam facilmente. Eu adorava as aulas da profe Maria do Rosário. Chorei copiosamente quando ela se foi e tive que ingressar no quarto e quinto anos com a profe Antônia, que apesar de não desfilar com as saias de balão, me fez gostar de fração. Quando ela saiu, me senti abandonada. Nos anos posteriores eu cursaria o ginásio e teríamos dez professores, um para cada disciplina. Impossível chorar pelos dez, então elegi um, apenas : O professor Jonas de biologia. Me falaram depois que ele era do DOPS , um agente da ditadura infiltrado em nossa escola, mas a única coisa que eu lembro é de suas magníficas aulas e de meu caderno cheio de bichinhos, que ele mesmo elogiara. Por sua causa quis ser cientista, bióloga, médica, mas me tornei professora. Tudo era tão difícil : Livros e fardas eram comprados e os meninos que moravam longe da escola tinham que ficar em casa de parentes pois não havia transporte, No entanto, a última coisa que passaria por minha cabeça, quando adolescente, seria fazer a pergunta à que me referi , no início desse texto, às minhas professoras, Analisando o caso, peço licença ao leitor para fazer uma outra pergunta : Se hoje as coisas são mais fáceis, porque tudo se tornou tão difícil ?


Responda :

1. Que características da crônica você reconhece nesse texto ?

2. Qual o tema abordado nessa crônica ?

3. Você percebe dferenças comportamentais entre professores e alunos nos dias atuais em comparação com os relatos da autora ?

4. A que se refere o pronome "tudo" na última linha do texto ?

5. Você concorda ou discorda com o ponto de vista da autora ? Justifique sua resposta.


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